KIT DE PRIMEIROS SOCORROS PARA FERIDAS EMOCIONAIS
Por Miguel Lucas
Estamos regularmente sujeitos a feridas psicológicas comuns,
como a rejeição ou fracasso, assim como fazemos feridas físicas, tais como
cortes ou arranhões. Mas enquanto estamos extremamente conscientes da
necessidade de tratar as feridas físicas, assim que elas ocorrem, quando se
trata dos nossos danos psicológicos, estranhamente, na grande maioria das vezes
ficamos apáticos. Se nos cortamos, não ficamos andando passivamente enquanto
vamos sangrando. Reconhecemos que ignorar o corte pode provocar infecção,
prolongando e aumentando a dor que sentimos. Limpamos a ferida, aplicamos
pomada antibacteriana, e fazemos um curativo porque sabemos que vai acelerar o
processo de cura, reduzindo o nosso desconforto imediato, e evitando que uma
lesão pequena se transforme numa maior.
Mas quando se trata de feridas psicológicas comuns, não
temos essa consciência preventiva e curativa. Geralmente não sentimos a
necessidade de limpar a ferida psicológica, nenhuma urgência para dar-lhe
atenção, não temos medo que essa pequena debilidade psicológica se transforme
num problema maior.
Sendo que, as feridas psicológicas apresentam exatamente os mesmos riscos para o nosso bem-estar emocional que as feridas físicas apresentam para a nossa saúde física. As feridas psicológicas também podem tornar-se “infetadas” se as ignorarmos. Também levarão mais tempo a cicatrizar se não cuidarmos delas. Também vão continuar a doer se não aplicarmos curativos emocionais equivalentes às pomadas e curativos.
Sendo que, as feridas psicológicas apresentam exatamente os mesmos riscos para o nosso bem-estar emocional que as feridas físicas apresentam para a nossa saúde física. As feridas psicológicas também podem tornar-se “infetadas” se as ignorarmos. Também levarão mais tempo a cicatrizar se não cuidarmos delas. Também vão continuar a doer se não aplicarmos curativos emocionais equivalentes às pomadas e curativos.
DANOS PSICOLÓGICOS COMUNS QUE ENFRENTAMOS NA VIDA DIÁRIA
Não corremos para o médico cada vez que temos uma tosse, um
arranhão, ou um incomodo no estômago. Costumamos tratar essas coisas em nossas
casas. Claro que, se não ficarmos melhor, acabamos por ir ao médico. Mas a
grande maioria do tempo, somos perfeitamente capazes de recuperar a nossa
saúde, sem intervenção médica profissional. O mesmo é verdadeiro quando se
trata de pequenos danos psicológicos. Se aplicarmos primeiros socorros
emocionais quando somos alvo de um abalo psicológico, devemos ser capazes de
recuperar a saúde emocional sem a assistência de um profissional de saúde
mental.
Em seguida apresento sete feridas psicológicas comuns que
podem exigir primeiros socorros emocionais:
1. Rejeição: A todo o momento podemos ser rejeitados de
alguma forma. Por um sócio, pelo empregador, amigos, cônjuges, entre outros. As
rejeições são os cortes e arranhões emocionais da vida diária. Podemos
desenvolver a crença que não somos pessoas desejadas ou com valor suficiente.
2. Falha: Frequentemente não conseguimos atingir os nossos
objetivos ou ficamos aquém do desejado. Uma má nota no teste da escola, não
terminámos uma tarefa a tempo, esquecemos um compromisso importante. As falhas
ou fracassos são como resfriados emocionais que, quando não tratados, podem
transformar-se em “pneumonias” psicológicas. Ou seja, debilitamos a confiança
na nossa imagem e por vezes nas nossas habilidades e competências.
3. Solidão: Todos nós temos períodos em que nos sentimos
sós, como se os nossos relacionamentos e interação com os outros não estivessem
a cumprir as nossas necessidades emocionais. O problema é que quanto mais nos
sentimos sós e desconectados, mais enfraquecemos os nossos “músculos” do
relacionamento. Podemos desenvolver a ideia de que não temos capacidade para
criar conexões significativas com os outros, ou que os outros não valem o nosso
investimento neles. Isso cria a ideia da separação e isolamento. Nós
desenvolvemo-nos através do contato e interação, se ficarmos privados disso,
certamente o equilíbrio emocional será afetado negativamente.
4. Perda: Regularmente experimentamos perdas na vida. Um
ente querido que morre, um amigo que vai viver para outra cidade, os nossos
filhos deixam de viver em nossa casa, ou o nosso animal de estimação favorito
morre. A forma como reconstruímos as nossas vidas depois de uma perda pode
determinar se emergimos mais fortes emocionalmente, ou psicologicamente mais
fracos.
5. Preocupação e ruminação: É fácil ficar preso em ciclos de
preocupação ruminando naquilo que sentimos, impelindo-nos a ficar imersos em
sentimentos de tristeza ou irritação, sendo difícil pensar em qualquer outra
coisa. Mas isso é como cutucar as nossas
cicatrizes emocionais, não lhes permitindo curar.
6. Culpa: Quando passamos várias horas por semana ruminando
na culpa, quando isso se torna excessivo, a nossa atenção é sequestrada ficando
difícil concentrarmo-nos no trabalho e em todas as nossas responsabilidades. O
sentimento de culpa persistente pode envenenar os nossos relacionamentos mais
significativos e, às vezes, afetar todas as áreas da vida.
7. Baixa autoestima: Por vezes passamos por períodos de
baixa autoestima. Nesses dias em que nos sentimos incrivelmente para baixo,
temos tendência para acionar a autocrítica negativa colocando as nossas
capacidades e valor pessoal em causa. Ter baixa autoestima é como ter um
sistema imunológico emocional debilitado. Torna-nos mais vulneráveis e mais propícios a agravar as feridas psicológicas existentes.
COMO UMA FERIDA PSICOLÓGICA PODE PROVOCAR OUTRAS?
Cada uma das feridas psicológica referidas anteriormente
podem afetar o nosso bem-estar emocional e até mesmo a nossa saúde física, especialmente
se o problema se prolonga até ao ponto de transformar-se num transtorno
psicológico. Um entorse no antebraço pode fazer-nos compensar os movimentos e
prejudicar o músculo do ombro, como resultado, pode causar stress nos músculos
das costas, de modo que podemos acabar tendo problemas para caminhar. Os danos
psicológicos podem agravar outros de maneira semelhante. A rejeição não tratada
pode causar danos à nossa autoestima, o que pode fazer-nos comportar
defensivamente e afastarmos as pessoas, o que pode contribuir para o isolamento
social, que por sua vez pode conduzir a uma depressão.
Este é apenas um exemplo, nem sempre as coisas tomam as
proporções referidas, mas certamente a vulnerabilidade psicológica não tratada
tende a promover outros problemas associados. Tratar os nossos danos
psicológicos assim que eles ocorrem pode evitar este efeito cascata e minimizar
a probabilidade de pequenas problemas se acumularem e tornarem-se muito piores
com o passar do tempo.
APLICAR OS PRIMEIROS SOCORROS EMOCIONAIS NOS DANOS
PSICOLÓGICOS
O primeiro passo no tratamento de feridas psicológicas
começa com o desenvolvimento da consciência daquilo que é preciso fazer para
recuperarmos do problema. A forma mais comum de “tratamento” que normalmente se
aplica quando sentimos dor emocional, é ventilar os nossos sentimentos. Isso
pode ser feito, reservando um momento e lugar para expressarmos aquilo que
sentimos, seja através do choro ou da consciência do impacto negativo que está
a ter no ânimo, motivação e autoestima. Para ajudar neste processo, por vezes,
algumas pessoas sentem-se confortáveis a conversar com um amigo ou com um ente
querido sobre o assunto. Mas vamos ser honestos, esses amigos são extremamente
raros.
O segundo passo é ajudar a si mesmo a acalmar as suas
próprias feridas psicológicas, acalmando a sua própria dor emocional,
interrompendo os ciclos de pensamentos prejudiciais que ecoam na sua mente, ou
reconstruir sentimentos de autoestima e autoconfiança. Para ajudar neste
processo importa que você tome consciência do seu corpo, mais propriamente em
que zona do seu corpo você sente as emoções negativas. Entre em sintonia com as
sensações do seu corpo. Foque a sua atenção nas sensações que o seu corpo lhe
proporciona. Por vezes são sensações desagradáveis, mesmo assim tente perceber
a sua localização para que conscientemente possa aliviar o incomodo.
As nossas
emoções estão estreitamente alinhadas com as sensações físicas sentidas nos
nossos corpos. Quando você experimenta uma emoção forte, você provavelmente
também sente isso em algum lugar no seu corpo.
Você sente tensão e incomodo em alguma parte do seu corpo?
Borboletas ou náuseas no estômago? Nó na garganta? Peso nos olhos? Ou, talvez
uma sensação de dormência? Registre o tipo de sensação que o incomoda,
identificando igualmente qual a parte do corpo em que se está a manifestar.
Importa ainda criar uma escala de intensidade, do genero: (0-10). Assim pode
dizer, por exemplo: “Hoje sinto uma tensão elevada de grau (8) na zona do
pescoço.” Ao quantificar a intensidade do incomodo, deixa de avaliar as suas
sensações físicas ligadas ao seu estado emocional em forma de tudo ou nada. A
gradação permite que mais facilmente possa escolher o que fazer para diminuir o
incomodo da dor e consequente sentimento que possa emergir.
O terceiro passo é identificar que emoções você estás
sentindo. A tensão no seu peito pode indicar ansiedade. As lágrimas nos seus
olhos e garganta apertada podem indicar tristeza. O seu coração acelerado pode
indicar medo ou apreensão. Se você ainda tiver problemas para identificar os
seus sentimentos, pode ser benéfico familiarizar-se com um leque alargado de
emoções, aumentando o seu vocabulário emocional. Depois de tomar consciência
das palavras que mais utiliza para descrever os seus estados emocionais,
pondere criar uma lista pessoal, especificando as sua emoções ou sentimentos.
Por exemplo: abandonado, aceite, agitado, agressivo, alerta,
maravilhado, ambicioso, divertido, enfurecido, animosidade, irritado,
apreensivo, ardente, despertado, envergonhado, traído, aturdido, amargo,
entediado, sem fôlego, alegre, pretensioso, frio, confortável, compassivo,
preocupado, confiante, confuso, corajoso, covarde, astuto, excêntrico, curioso,
cínico, encantado, delirante, entre outros.
O quarto passo é aplicar estratégias de diminuição da dor
emocional. Por exemplo, se você está demasiado angustiado e irritado, por
momentos foque a sua atenção na sua respiração, fique com ela, torne-se nela.
Observe a sua respiração, flua com ela, sinta o seu corpo a relaxar à medida
que vai respirando. Mesmo se seja por breves momentos, este exercício
permite-lhe distanciar-se dos seus apegos, dos seus desejos, das suas
necessidades, usufruindo de um estado pleno de tranquilidade. A sua mente ficou
calma e clara. Chame até si esse estado de lucidez e tranquilidade sempre que
sentir que está a perder o controle dos seus pensamentos e sentimentos. Torne
este exercício num hábito. Habitue-se a promover esse estado. Com a prática
esse estado passará a ser-lhe familiar. Use-o sempre que se sentir perturbado e
a sua razão comece a abandoná-lo.
O que mais importa é você ter a noção que pode decidir
realizar algumas atividades ou aplicar algumas técnicas que possam melhorar o
estado depreciativo que está a enfrentar. Para consolidar este último passo,
chame até si esse estado de lucidez e tranquilidade sempre que sentir que está
a perder o controle dos seus pensamentos. Depois, já mais estabilizado e
consciente das suas emoções, onde elas se manifestam e qual o impacto que estão
a ter em você, decida-se a colocar em ação uma atividade, estratégia ou técnica
que promova o seu bem-estar.
Exemplo 1: Quando você percebe que apesar de estar a viver
um momento de dor emocional consegue fazer algo para apaziguar essa dor,
provavelmente irá permitir-se relaxar e encontrar espaço mental para ser mais
positivo e construtivo. Você pode aprender a relaxar o seu corpo e a diminuir a
ansiedade e angústia associadas aos momentos de tensão da sua vida. Tem um nó
no seu estômago, pode apenas relaxar. A parte de trás do seu pescoço está
tenso, pode apenas relaxar. A sua mente está agitada, pode apenas relaxar.
Quando desenvolvemos a capacidade de promover boas sensações no nosso corpo,
ficamos numa posição mais confortável para enfrentarmos os problemas que nos
surgem na vida sem lamentações vitimizantes.
Exemplo 2: Pode ajudar você aceitar a sua experiência de
abalo psicológico, por aquilo que ela é, e apoiar a si mesmo, dizendo
gentilmente: “Estou a sentir-me triste neste momento, tenho motivos para isso,
mas em breve irei ficar melhor.” Pode imaginar que alguém que ama está
reconfortando você nesse momento de dor emocional. É uma boa ideia fazer pausas
na ruminação da sua emoção. A vida é um processo de aprendizagem, perceba o que
é melhor para você. Tente perceber o que está fazendo você sentir-se dessa
forma, e quanta intensidade emocional consegue suportar. Reconhecendo os seus
limites e pontos fortes é uma poderosa forma de cuidar de si mesmo. Isso
permite, que no tornado emocional, você perceba que está na hora de orientar a
sua atenção para algo que restabeleça a sua energia, para mais tarde voltar ao
assunto que o perturba, mas mais revigorado.
Quando você estiver pronto para uma pausa, pode perguntar:
“O que posso fazer para sentir-me um pouco melhor?” Pode ser tão simples como
ir fazer uma caminhada ou beber uma xícara de chá quente. Você pode obter o
apoio de um amigo, terapeuta, ou através da oração ou meditação. Ao longo da
experiência, pergunte a si mesmo: “Qual é a melhor coisa que posso fazer por
mim agora?”
Exemplo 3: Para superar e ultrapassar as suas emoções
desagradáveis, você pode tratá-las com gentileza. Utilize o mesmo método que
utilizaria para se aproximar de alguém que está sofrendo, seja compassivo com a
sua própria dor. Embora não possa mudar nada, a compaixão com a dor promove a
superação. Não é diferente do que acontece quando você acalma uma criança
chorando, oferecendo abraços, beijos e amor, ou quando você se sente melhor
depois de permitir-se chorar. Fique com as suas emoções e certifique-se que
você está bem. Ao fazer isso, você vai notar que se sente ligado a você mesmo e
que desta forma se sente “bem” (embora possa estar a passar por momentos menos
bons e a ter sensações e sentimentos desagradáveis).
Dica: Nós não somos as nossas emoções, somos aquele que
sente as emoções e que pode decidir ficar de bem com elas, mesmo sabendo que
são difíceis de suportar. Entender este conceito, é um passo importante para
separarmo-nos das nossas emoções. Elas pertencem-nos, mas nós somos muito mais
que isso. Não somos os nossos sentimentos. Nós somos aquele que sente.
O que mais importa é aumentar a sua consciência para
reconhecer que você precisa tomar uma atitude quando é afetado por um abalo psicológico.
É primordial refletir sobre as suas necessidades emocionais em tais momentos, e
tomar medidas para aplicar as técnicas de primeiros socorros emocionais, e
encontrar as técnicas que funcionam melhor para você.
Com o tempo, você vai desenvolver o seu próprio processo
psicológico de recuperação que pode usar sempre que necessário, podendo ainda
compartilhar com os seus filhos, amigos e familiares. Se com o tempo as suas
feridas psicológicas agravam, não hesite em procurar ajudar profissional.
Abraço,
Miguel Lucas
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